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A Entidade | Conto de Terror

Nyashara não era uma garota normal, era mais sensível que a maioria. Via e sentia coisas que não sabia explicar, tinha sonhos que mais pareciam premonições, pois sempre acabavam se realizando, mais cedo ou mais tarde.


Seu pai já havia morrido e, mesmo tendo sido ausente, seu último desejo era ver sua filha esquecida, mas não pôde. Morava com sua mãe e com o irmão, que apesar de viver sozinho, estava sempre na casa da mãe. Nyashara e o irmão nunca tiveram uma relação saudável: enquanto ela era amorosa e atenciosa, ele estava sempre a humilhando e diminuindo.


Numa tarde, o irmão de Nyashara começou a provocá-la, debochando da sua dor, tentando desestruturá-la e arrancar dela alguma reação. Durante anos de abuso emocional, todo o amor que Nyashara sentia foi se transformando em uma fúria reprimida. Ela tentava perdoar, mas estava ficando impossível continuar se fazendo de cega para cada “imbecil” e “idiota” que ouvia. Cada tapa, cada queimadura não feria apenas sua carne, estava destruindo a vida que havia dentro dela.


O transbordar aconteceu. Enquanto o irmão trabalhava para levá-la ao limite, Nyashara foi em busca de uma faca, pronta para revidar toda a dor e abuso que ele a fizera suportar. Mas, ao estender a mão para pegá-la, uma força a conteve e sussurrou:


Não faça isso. É isso que ele quer: te provocar até poder te matar e ainda te culpar. Você não vê isso?


Nyashara ficou imóvel. Não por vontade própria, mas porque essa “força” a impedia de cair na armadilha do víbora de seu irmão. Ela sentia que apenas seu corpo estava ali; suas emoções haviam sido subitamente tranquilizadas, como se algo maior a dominasse.


Mas naquele instante, ainda restava nela uma centelha de ódio incontrolável. Um ódio por toda a injustiça que vivenciou sem revidar. E então, na força do ódio, ela declarou:


Todos que se levantarem contra mim perecerão. Todos os meus inimigos agonizarão até a morte.


Sua fúria era tão intensa que aquilo não foi apenas uma frase. Algo foi criado ali, mas ainda não se podia ver ou entender.


Semanas se passaram. Tudo parecia normal. Nyashara não falava mais com seu irmão, nem tentava conviver. Um dia, ele saiu e não voltou. Alguns dias depois, a polícia bateu à porta: seu irmão havia morrido de forma brutal. Um homem o fechou no trânsito, começaram a discutir, e então o homem, acompanhado de dois amigos, começou a espancá-lo. Foram tantos socos e chutes que ele não resistiu. Morreu ali mesmo.


Nyashara não ficou triste. Ficou intrigada. Se perguntava o que poderia ter acontecido. Seria apenas coincidência? Mas ela sabia: coincidências não existem.


Então, ela ouviu um sussurro:

Você gostou do que eu fiz?


Assustada, ela perguntou:

Quem é você? O que você fez?


O sussurro respondeu:

Fui eu quem criou a briga de trânsito. Enquanto o espancavam, eu perguntei se era bom sentir na pele o prevalecimento de um “machão”. Você gostou?


O que é você? Quem é você? — insistiu ela.


Como não sabe? Você me criou naquele dia da briga. Estou apenas fazendo o que você disse: acabando com seus inimigos. Não era isso que você queria?


Sim... estou cansada de não incomodar ninguém e, ainda assim, ser humilhada, prejudicada, magoada. Estou exausta. Não ganhei nada por ser boa, só decepções. Me sinto morta por dentro...


A entidade silenciou, mas sua presença podia ser sentida.


Naquela noite, Nyashara dormiu e foi levada ao evento, assistiu tudo acontecer.


No dia seguinte, foi para a faculdade. Sua colega Bianca, ao vê-la, esbarrou de propósito nela tentando fazê-la cair, e com um sorrisinho amarelo disse:


Ops! Me desculpa, foi sem querer...


Mal terminou de falar, deu dois passos e... caiu sozinha. No primeiro lance de escadas, Bianca quebrou a perna e o braço com fraturas expostas. De forma inexplicável, rolou também o segundo lance, quebrando o pescoço, mas não morreu... Ainda.


Nyashara a olhou nos olhos. Bianca tentava respirar, puxava o ar, o sangue jorrava. Todos estavam apavorados. Bianca morreu ali, aos pés dela.


Ao sair da faculdade, Nyashara encontrou Bernardo, seu ex-namorado. Ele a havia traído, e agora queria se reaproximar, fingindo arrependimento. Ela não poderia perdoar. Traição é uma escolha, e não tem perdão. Uma lágrima caiu de seus olhos. Uma fisgada em seu peito. Quando Nyashara cruzou o portão, Bernardo teve um ataque cardíaco fulminante e morreu ali mesmo.


Muito obrigada por me vingar... — disse ela.


Eu sou sua vontade manifesta. Estou apenas cumprindo o que fui criado para fazer! — respondeu o sussurro.


Nyashara trabalhava em casa, mas duas vezes por semana ia a um escritório prestar serviços. Chegando lá, sua colega Camila foi até sua mesa:


Você precisa abrir o olho com a Carol. Ouvi ela sugerindo ao Júlio que você deveria ser demitida...


Nesse momento, Carol passa pela mesa:

Oi, querida! Quais as novidades? Estava sentindo sua falta, amiga!


Nyashara, cheia de fúria, apenas a olhou profundamente nos olhos.


Camila voltou ao trabalho. Júlio foi para a copa do escritório. Antes de sair, Carol se aproximou:

Quer alguma coisa? Vou pegar um café...


Nyashara balançou a cabeça negativamente, sem dizer uma palavra.


Carol se despediu e seguiu. Sussurrou algo para Júlio e ambos olharam para Nyashara, rindo.


Ela respirou fundo e abaixou a cabeça. Desde o primeiro encontro, Carol não gostava dela. Mas isso não era o problema. Em seis meses, Carol fizera fofocas e intrigas com várias colegas. E Júlio... não fazia nada. Nem a demitia.


Enquanto todos trabalhavam, o microondas deu um curto-circuito. Um vento forte cortou o escritório, batendo a porta da copa. Um incêndio começou. A porta não abria. Carol e Júlio gritavam desesperados:


Socorro! Por favor, me ajuuuda!


Os bombeiros foram chamados. O prédio foi evacuado. Uma explosão na copa ensurdeceu o silêncio. Nada mais foi atingido, apenas a copa. Quando conseguiram abrir a porta, o soldado informou: não havia sobreviventes.


Camila sussurrou para Nyashara:

Finalmente acabou... só não pensei que seria assim.


Nyashara respirou fundo, abaixou a cabeça e respondeu:

Não, meu amor. Apenas começou...


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